GeoLeiria

Este Blog pretende ser o ponto de encontro e debate dos Geólogos em/de Leiria e de todos aqueles que gostam desta ciência ou de Biologia, Geografia, Ambiente e Astronomia, entre outras. Criado no âmbito do Projecto Ciência Viva VI "À descoberta da Geologia em Leiria", com membros nas Escolas Correia Mateus e Rodrigues Lobo, Núcleo de Espeleologia de Leiria e Centro de Formação de Leiria, neste local serão colocadas novidades locais, nacionais e internacionais, actividades de Escolas e outros.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Chernes e ornitorrincos

Do Blog Ciência ao Natural, do paleontólogo Luís Azevedo Rodrigues, publicamos o seguinte post:

(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 18/10/2007)

“A prova de que Deus tem sentido de humor é o ornitorrinco”
, Woody Allen

A atribuição de características humanas a seres vivos ou a elementos naturais – antropomorfismo – é recorrente na literatura, pintura ou na linguagem do dia-a-dia. O inverso – zoomorfismo – que é designar ou conceder singularidades animais a pessoas ou instituições humanas, é frequente na vida política portuguesa. O mais recente caso compara a situação do maior partido da posição ao ornitorrinco – Ornithorhynchus anatinus.


Pacheco Pereira, no seu livro “O Paradoxo do Ornitorrinco – textos sobre o PSD” deve, e digo deve pois não li o livro, discorrer sobre o aparente caos em que o PSD parece estar mergulhado.

Mas quais os motivos pelos quais o ornitorrinco exerce um fascínio tão grande?

Apesar de mamífero, as fêmeas ornitorrinco colocam ovos sendo as crias posteriormente alimentadas com o leite materno. Este animal apresenta ainda a mandíbula semelhante a um bico de pato, morfologia ímpar entre os mamíferos, morfologia que está na justificação etimológica do seu nome científico Ornithorhynchus – focinho de ave.

É esta amálgama de particularidades reptilianas, avianas e mamiferóides que contribuem para que este monotrémato – grupo de mamíferos primitivos a que pertence o ornitorrinco – desempenhe um papel quase mitológico no imaginário colectivo.
Num dos capítulos de “A Feira dos Dinossáurios” do paleontólogo e historiador da Ciência Stephen Jay Gould, é feita a resenha histórica de como os naturalistas dos sécs. XVIII e XIX observavam o ornitorrinco. Primitivo, ineficiente e imperfeito foram alguns dos adjectivos utilizados então para descrever o mamífero australiano. A Natureza, para aqueles cientistas, deveria apresentar divisões claras e inequívocas na sua diversidade de formas. Estas divisões seriam o resultado da sabedoria divina.

A miscelânea morfológica do ornitorrinco originava, assim, acesos debates não só biológicos mas também teológicos.


Os monotrématos (como o ornitorrinco) divergiram evolutivamente das linhagens de mamíferos marsupiais (como o canguru) e placentários (como o ser humano) há mais de 100 milhões de anos. Assim, sempre se pensou que estariam desprovidos da fase REM do sono (nos humanos a fase do sono em que se sonha) pois esta seria uma característica moderna. Um estudo de 1998 veio desmentir aquela suposição – o ornitorrinco apresenta sono REM. A quem interessar…

O aparente paradoxo, seja político, morfológico ou outro, materializado na forma do ornitorrinco, assenta na errada premissa evolutiva de que os organismos não devem apresentar fusão de características – um animal não deveria colocar ovos e alimentar as suas crias com leite produzido por glândulas mamárias, entre outras.

Gould contrapõe que é precisamente essa amálgama de especificidades que teriam concedido ao ornitorrinco vantagens evolutivas.

Um outro caso de zoomorfismo político envolveu, no passado recente, um conhecido político português e o poema de Alexandre O'Neill:

Sigamos o cherne, minha amiga!
Desçamos ao fundo do desejo
Atrás de muito mais que a fantasia
E aceitemos, até do cherne um beijo,
Senão já com amor, com alegria...

Adivinhem quem é…

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