GeoLeiria

Este Blog pretende ser o ponto de encontro e debate dos Geólogos em/de Leiria e de todos aqueles que gostam desta ciência ou de Biologia, Geografia, Ambiente e Astronomia, entre outras. Criado no âmbito do Projecto Ciência Viva VI "À descoberta da Geologia em Leiria", com membros nas Escolas Correia Mateus e Rodrigues Lobo, Núcleo de Espeleologia de Leiria e Centro de Formação de Leiria, neste local serão colocadas novidades locais, nacionais e internacionais, actividades de Escolas e outros.

sexta-feira, janeiro 28, 2011

Estamos a ficar velhos (como espécie...)

Ferramentas de pedra encontradas na Arábia põem em causa a visão consensual
O Homo sapiens terá começado a espalhar-se pelo mundo muito mais cedo, há 125 mil anos

Estes machados encontrados na Península Arábica têm 125 mil anos e levaram os cientistas a uma nova hipótese

E se, há uns 125 mil anos, muitas dezenas de milénios antes de se lançarem à conquista da Europa e do resto do mundo, vindos do seu berço africano, os primeiros humanos modernos tivessem começado por atravessar um estreito braço de mar para se instalarem em terras que hoje fazem parte dos Emirados Árabes Unidos? Uma equipa internacional de arqueólogos, liderada por Hans-Peter Uerpmann, da Universidade Eberhard Karls de Tubingen, sugere precisamente isso, com base em escavações realizadas na localidade de Jebel Faya, a uns 50 quilómetros do Golfo Pérsico. Os seus resultados são publicados sexta-feira na revista "Science".

O debate sobre como e quando os primeiros homens modernos emigraram de África e se espalharam pelo mundo vem de longe. Há quem diga que houve uma única vaga de migração e quem diga que houve várias. Mas seja como for, os dados conhecidos até aqui indicavam que o êxodo tinha acontecido há mais ou menos 60 mil anos. Quanto à rota seguida por aqueles emigrantes até a Europa e Ásia, também aí havia consenso: através do Vale do Nilo e do Médio Oriente.

O que os cientistas encontraram agora na Península Arábica são ferramentas que, segundo eles foram fabricadas com tecnologias semelhantes às utilizadas pelas populações de "Homo sapiens" que viviam no Leste de África, mas diferentes das tecnologias originárias do Médio Oriente. Isso não seria problemático se elas tivessem menos de 60 mil anos de idade. Mas acontece que, quando foram datadas (pela técnica dita de luminescência), revelaram ter... 125 mil anos.

Ou seja, estas ferramentas — pequenos machados e lâminas de pedra, entre outros — parecem contar uma história diferente. Uma história de emigração directa, há muito mais tempo, de África para a Arábia — e daí, dizem os cientistas, para o Crescente Fértil e para a Índia. Porém, nem todos os especialistas concordam com esta interpretação.

“Os humanos ‘anatomicamente modernos’ — como nós — emergiram em África há uns 200 mil anos e a seguir povoaram o resto do mundo”, diz em comunicado Simon Armitage, da Universidade de Londres e co-autor do trabalho. “Os nossos resultados deveriam estimular uma reavaliação da maneira como nós, os humanos modernos, nos tornamos uma espécie global.”

Os cientistas analisaram ainda as condições climáticas que reinavam na região há uns 130 mil anos, durante o último período interglaciar, para ver se a passagem de África para a Arábia teria sido fácil. E de facto, concluíram que o estreito de Bab al-Mandab, que separa a Península Arábica do Corno de África, tinha naquela altura pouca água devido ao baixo nível do mar, permitindo a passagem em segurança sem grandes problemas.

E mais: a Península Arábica era então uma região muito mais húmida, com vegetação abundante, com lagos e rios — muito mais acolhedora do que hoje. “Em Jebel Faya”, salienta Armitage, “a datação revela uma visão fascinante, na qual humanos modernos emigraram de África muito mais cedo do que se pensava, ajudados pelas flutuações globais do nível do mar e pelas mudanças climáticas.”

Uma voz dissonante

Num artigo jornalístico que acompanha na revista "Science" a publicação dos resultados da datação das ferramentas de Jebel Faya, surge uma voz dissonante entre os comentários entusiastas de vários especialistas. Paul Mellars, arqueólogo da Universidade de Cambridge, diz que, quanto a ele, apesar da descoberta das ferramentas ser importante e a datação bem feita, as conclusões estão erradas.

“Não há qualquer indício aqui que sugira que foram feitas por humanos modernos, nem de que eles vinham de África”, declara. E salienta que, ao contrário do que afirmam os autores da descoberta, não fica excluída de forma convincente a hipótese de se tratar de ferramentas fabricadas pelos Neandertais — ou até pelo "Homo erectus", antepassado dos humanos modernos que se sabe ter emigrado de África para Ásia há cerca de 1,8 milhões de anos.

Hans-Peter Uerpmann, um dos líderes da equipa que fez as escavações em Jebel Faya, concede que para “poder ter a certeza absoluta” de que as ferramentas foram fabricadas pelo Homo sapiens, vai ser preciso encontrar ossos fossilizados. Várias equipas de arqueólogos já declararam que tencionam lançar-se nessa procura.